24 de março de 2014

Ribas

Quando entrei para a faculdade, um amigo, todo Linda-a-Velha Hardcore, via nos Tara Perdida uns inimigos, batata frita pala pala o que é essa merda, perguntava-se ele, e eu não sabia responder, enquanto eu e outros ouvíamos os dois primeiros álbums: a produção era manhosa, algumas das letras eram de cair para o lado de más, mas, aos dezassete anos chegava e sobrava para, o que era  para nós, a continuação dos Censurados, banda que me faz lembrar os punks que se sentavam perto da estação de Cascais, sim, é verdade, havia punks sentados na estação, todos os dias, lá estavam eles, cristas e tudo, e eu todo betinho, cabelo à tigela, a pensar para mim que ouvia muita música em comum com aquela gente, isto em noventa ou noventa e dois, havia um dos punks que tinha um casaco de ganga com um patch gigante dos Helloween nas costas, e nas mangas tinha escrito a caneta azul CENSURADOS, e eu soprava a franja dos olhos e pensava que quando crescesse ia ser assim. Falhei na previsão. Um dos hábitos que tínhamos na faculdade era combinarmos de manhã (só tinhamos aulas às duas da tarde) à porta do metro na baixa para irmos à Carbono, na Almirante Reis. Na altura não havia cá metro no Cais-do-Sodré, essas mordomias modernas. Então lá íamos em excursão à Carbono, comprar cenas do nu-metal que era o que ouvíamos na altura, gastar contos como se não houvesse amanhã. E das imagens que eu guardo do Ribas é ele sentado nas escadas do centro comercial Portugália, onde era a Carbono, com uma garrafa de cerveja ao lado, e nós a passarmos e a olharmos para ele, ele a olhar-nos de lado e nós olha o Ribas, olha o Ribas, e ele sem nos ligar nenhuma, e isto aconteceu diversas vezes. 
Entretanto desliguei-me de Tara Perdida (lembro-me de ver o clip do Nasci Hoje no Sol Música, mas não liguei muito) até cerca de 2008. A Catarina, então com cinco anos, queria ouvir música em português para conseguir cantar as letras. Então lá andei a pensar no que ela podia ouvir, surgiram algumas bandas candidatas e eu fui submetendo-a (com uma selecção prévia feita por aprovação maternal por causa das letras) a vários testes, e ela gostou muito de Tara Perdida (dos três últimos álbums, deixei os dois primeiros de fora). Das imagens que hei de guardar sempre será ela, a caminho da escola, de farda, de punho pequenino no ar, ainda com voz de bebé, a cantar coisas como "um conceito que me dê força de libertação, um sentido de viver uma razão, querer sempre acreditar que por mais que eu possa errar espero sempre encontrar solução, quero sempre encontrar solução, e hei-de sempre encontrar solução" ou "o sentimento é imaginação, promessas feitas só por ilusão, nunca mais eu vou ficar aqui". Em 2009 fui vê-los ao Coliseu e ela não foi: tinha seis anos, era demasiado pequena, ainda liguei para o Coliseu para saber se havia alguma hipótese de ela ir, ficávamos cá atrás sentadinhos, era o sonho dela, ver Tara Perdida, mas, não, o bilhete dizia maiores de doze ou lá o que era, nada feito, lá fui ao concerto e ela, durante muito tempo, não me perdoou. Foi um concerto muito arriscado, uma banda punk de Alvalade a tocar no Coliseu? Estavam doidos. O concerto foi muito bom, estava uma boa casa: recordo-me do espanto do Ribas a dizer eh lá, está compostinho, parece um concerto a sério.
Ainda há um mês estávamos ouvir de manhã na rádio, a caminho da escola, que os Tara Perdida iam entrar em digressão, passando pelo Garage. Apesar de ela já não ouvir com a frequência de antigamente e agora andar a ouvir outras coisas que, enfim, fazem parte da idade dela, não resistiu a perguntar se íamos. Podemos ir, respondi eu. Não podemos. 
Em 2006 deram um concerto do caraças no Incrível Almadense. Em jeito de homenagem, um obrigado e um adeus, ficam as boas memórias.


3 comentários:

Johnny Guitar disse...

Bela homenagem.

jack disse...

a primeira vez que mostrei um vídeo dos tara a uma ex-namorada, aí há 10 anos, o comentário dela foi "parece um trolha". lembrei-me logo disso quando vi a notícia na 2ª feira, lá foi o ribas fazer tijolo.

p.s. quando a tua miúda se safar com o inglês, mostra-lhe twelve2go.

macaca grava-por-cima disse...

bonita homenagem!
tb lhe deixei uma no meu blog: http://www.macaquinhasnosotao.blogspot.pt/2014/03/para-recordar.html