2 de abril de 2014

Cabrera Infante, you bastard

Começar bem o dia é levar com um homem que trazia um livro estragado, a teimar que comprou o livro na tua loja, quando o livro não era lá vendido desde... dois mil e seis, teimar que foi há um mês, ver reticências atrás, mostrar o canhoto que há dentro do livro, coisa que não se usa desde aproximadamente há uma porrada de anos, não é do meu tempo de livreiro, ter visto a léguas qual é o livro e comentar com um colega que talvez, só talvez, o senhor não esteja a perceber as artimanhas do Cabrera Infante, enviá-lo para a concorrência, a editora, afinal de contas, é deles, eles que arranjem ao senhor um livro novo ou resolvam a questão, o senhor insiste que quer a nova edição de uma nova editora que por acaso até é de boa gente de nossa casa, eu insisto para que ele vá lá abaixo, e isto não é uma metáfora, é mesmo para ir à concorrência, ele vai, ele volta, a concorrência, obrigado cabrõezinhos, diz que não, que nós, como vendedores, é que temos de resolver o problema ao senhor, apesar de, claramente, o livro não ter sido ali comprado, pelo menos nos últimos oito anos, e do mesmo já estar esgotado, então, em desespero, digo que falarei com nosso senhor Jesus o Cristo, se for preciso, para tentar resolver o assunto ao homem, e, só naquela, peço-lhe para-me mostrar o problema do livro: o problema, "problema", é que o Cabrera Infante tem muita piada e lembrou-se de imprimir uma página espelhada da página anterior, logo a seguir de várias páginas em branco, então disse-lhe que era mesmo assim, o homem pensou que estava a gozar com ele, fui buscar a nova edição, mostrei-lhe exactamente as mesmas páginas, ele conferiu ainda três vezes, apertou-me a mão, pediu desculpa pelo incómodo e foi à sua vida, e eu aqui devia ter ido à minha, mas, parecendo que não, a minha vida é isto.

2 comentários:

Mak, o Mau disse...

É o reflexo da história vs. a história do reflexo.

Não sendo eu livreiro, emprestei em tempos o Filth do Irvine Welsh a um amigo. No dia seguinte o meu amigo devolve-me o livro, dizendo "Epá, tu ainda não leste isto pois não? Lá pelo meio tem as páginas todas lixadas e a impressão toda mal feita"

O que acontecia, lá pelo meio, é que o Irvine e os seus delírios tem lá páginas em que um parasita interno do protagonista interrompe os pensamentos do mesmo, colocando os seus próprios pensamentos em acção. E isso rebenta com o grafismo todo.

Escusado será dizer que nunca mais lhe emprestei livros sem explicar tudo bem explicadinho primeiro.

Nada disse...

Ai adoro gente defeituosa xD