2 de julho de 2012

Memorial

Amanhã vou entregar a Catarina a casa da mãe, apesar de ser alguns dias antes do previsto, não sou capaz de negar a ida da filha para casa da mãe sabendo que se ela não vai uns dias mais cedo eram apenas cinco dias que se viam num mês e meio e isso é pouco, muito pouco, eu não me imagino com tão pouco tempo da minha filha na minha vida, mas é assim a realidade destas coisas, as pessoas fazem escolhas e vivem com elas, outras há que acham que vivem com as escolhas dos outros mas, na realidade, as escolhas foram nossas lá bem atrás, e eu nunca me esqueço disso, e ela hoje, pela primeira vez, confessou saudades da mãe.
Estava com ela desde dia catorze e, tal como nas férias do ano passado, a sensação que fica agora, nesta última noite (ela já dorme, a história do tubarão acompanhada com a viola faz milagres) é de que devia ser sempre assim, sempre, esta palavra que se teima em dizer mas que nunca (ironia) se concretiza, e assim num dia estou a apanhá-la na festa da escola para iniciarmos as férias, abro e fecho os olhos uma vez e pronto, está ela a dormir na véspera de se ir embora, os dias de praia, as idas ao shopping para comprar roupa e trocar cromos, as festas da rã e de tires e os arraiais e tudo o mais, desaparece tudo diante de mim e fica apenas este grande e amargo vazio, e agora vêm aí os dias em que nada parece fazer sentido, em que me vou arrastar pelo tempo, talvez pelo espaço, abrir e fechar livros, ler capítulos sem apanhar nada, a cabeça pode estar cá mas a verdade é que eu leio com a merda do coração.


3 comentários:

Panda disse...

Escreveste isto com uma urgência... Fico fascinada com a maneira como falas da Catarina e agora também me senti triste.

J disse...

Bem, foi mesmo por acaso que comecei a ler o teu post enquanto ouvia esta música: http://www.youtube.com/watch?v=sZR04yJZopY&feature=related, e de repente tudo isto ganhou outra dimensão. Provavelmente, nem foi pela música, mas talvez porque já fui (ou sou)uma Catarina e sinto o mesmo que tu mas em relação ao meu pai...

Ricardo disse...

ana, acho que é o normal quando escrevo destas coisas...

J, espero que a Catarina cresça e pense o mesmo que tu.