17 de setembro de 2014

Last of Us, a Estrada, o medo



Ando a jogar o The Last of Us. Ando mais ou menos, na verdade quem passa mais tempo com o comando é a senhora que me ofereceu a edição especial do jogo, eu, como bom homem, sou chamado a intervir nas situações mais complicadas. Talvez por poder observar durante alguns períodos de jogo, essencialmente de exploração, tem sido uma experiência diferente ao nível dos videojogos: consigo pensar em coisas que, se estivesse concentrado a jogar, talvez não pensasse. Ao passear pela paisagem desoladora do jogo não consigo deixar de traçar diversos paralelismos entre este jogo e a Estrada, do Cormac McCarthy: a sensação de abandono e, muitas vezes, de desespero, atravessam ambas as obras (o jogo é uma obra de arte, lidem com isso), o facto de viajarmos por um cenário pós-apocalíptico acompanhados de um menor (o filho no livro, aqui uma rapariga) e o encontrarmos grupos de sobreviventes com más intenções são também pontos em comum. A Time colocou um fotógrafo de guerra a jogar o jogo (este tem um modo de fotografia que podemos usar a meio da acção) parar tirar umas fotos do jogo e o homem sentiu-se desconfortável no papel do protagonista, pela violência das acções dele, e não conseguiu jogar mais, teve de pedir a um colega que jogasse por ele, o mariquinhas. Nos longos períodos que passamos a explorar não consigo deixar de pensar no livro do McCarthy, nas relações entre as pessoas, na confiança que devemos depositar ou não em quem nos rodeia, em como seria triste um mundo pos-apocalíptico sem coisas essenciais como jogos do Benfica. Quando recebi o jogo pensei que ia passar o tempo a disparar sobre hordas de zombies. Não podia estar mais enganado. Os zombies não são sequer a maior ameaça: servem, aliás, para tornar o jogo mais leve. As cenas mais violentas e que mexem mais connosco são as que se passam entre os humanos sobreviventes. Conheci pessoas que só gostavam de jogar “jogos de tiros”, como muita gente os apelida, se os inimigos fossem máquinas ou seres extra-terrestres ou zombies. Tudo menos humanos. Confesso que na altura ficava algo perplexo. Hoje em dia, e tendo sempre em mente a máxima “isto é só um jogo”, consigo perceber bastante bem a perspectiva deles. Para mim não existe uma linha que devamos traçar em termos de violência e terror numa obra, seja de que género for: depois cada um é livre de escolher o que faz com a obra. Até ignorá-la. 


Sem comentários: